O desgosto da oposição síria com o Brasil
18/03/12 17:22Visto o casaco e já estou pronto para sair quando Ammar Al Wawi, capitão do Exército Livre da Síria (ELS), me segura pelo braço. “Diga à sua presidente que ela também terá uma revolução no Brasil se continuar apoiando o regime sírio”, avisa e completa com um sorriso. “E que nunca mais torceremos para a seleção brasileira”.
Refugiado na Turquia, como outros milhares de sírios, Wawi, 35, serve como porta-voz do ELS, a milícia rebelde formada principalmente por desertores do Exército. Com o apoio do governo turco, montaram uma base na fronteira e se articulam para derrubar o ditador Bashar Assad. Mas faltam organização, homens e, principalmente, armas para fazer frente às forças do regime, que em um ano de revolta matou mais de 8 mil civis.
Sem sapatos e cercado de exilados sírios, em quase uma hora da entrevista de Wawi à Folha (publicada na versão impressa), a maioria das queixas foi direcionada ao Irã, principal aliado de Assad, Rússia e China, que bloqueiam uma condenação ao regime no Conselho de Segurança da ONU.
Mas sobraram críticas também ao Brasil e outros países que não expressam apoio à revolta. Em uma visita a um dos três campos de refugiados na fronteira, eu já havia ficado surpreso com o nível de informação dos sírios sobre a posição de cada país em relação à crise em seu país.
“Por que seu país votou a favor de Assad no Conselho de Segurança?”, questinou-me um deles à queima-roupa, assim que entrei em sua tenda, equipada com internet e TV por satélite sintonizada na Al Jazeera. Ele se referia à votação no CS no ano passado, quando o Brasil ainda era membro do órgão e se absteve sobre uma resolução condenando a violência do regime Assad.
Wawi, o capitão desertor, sabia detalhes da biografia de Dilma Rousseff que só aumentaram sua decepção. “Ficamos felizes quando ela foi eleita, sabemos que lutou contra a ditadura. Por isso fica difícil entender porque não apoia a nossa revolução”, reclamou.
O desgosto lembra a reação dos rebeldes na Líbia com a proximidade do governo brasileiro com o regime de Muammar Gaddafi e a demora do Brasil em reconhecê-los. Até hoje o novo embaixador não assumiu a embaixada em Trípoli.
Na Síria, o clima é parecido. Quando estive em Damasco, em setembro do ano passado, jovens opositores da periferia de Damasco se preparavam para queimar uma bandeira do Brasil.
Mesmo os países que mais criticam Assad, como Turquia, França e EUA hesitam diante dos riscos de uma intervenção militar. Embora tenha elevado o tom das críticas à violação dos direitos humanos no país, o Brasil não tem intenção de fechar a embaixada na Síria e continua acreditando numa solução negociada para a crise.
O capitão rebelde se irrita. “Depois de tantos mortos pelo regime, é absurdo acreditar que a negociação ainda é possível”, diz Wawi.
Ele reitera que só uma intervenção militar porá fim à violência do regime e não se assusta com os riscos de uma interferência externa.
“A verdade é que já existe uma intervenção estrangeira na Síria. Irã e Rússia têm bases militares no país e o [grupo xiita libanês] Hizbollah atua livremente”, completa.