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Marcelo Ninio

No Oriente Médio

Perfil Marcelo Ninio é correspondente em Jerusalém

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O profeta do apocalipse árabe

Por Marcelo Ninio
16/05/12 17:25

Crise existencial na praça Tahrir: "Ser ou não ser?" (Foto: Marcelo Ninio)

ISTAMBUL – Faço uma parada forçada de algumas horas em Istambul a caminho do Cairo, onde acompanharei a imprevisível reta final da campanha presidencial no Egito.

A escala é involuntária, mas acabou sendo um ótimo trampolim para mergulhar nas questões mais intrigantes da primeira eleição para presidente desde a renúncia do ditador Hosni Mubarak: o novo Egito continuará secular ou dará uma guinada definitiva rumo ao Estado islâmico, arrastando toda a região junto? Um meio termo é possível, como no exaltado modelo de democracia islâmica da Turquia?

O embate final promete fortes emoções. Até alguns dias atrás, parecia certo que a disputa ficaria entre o secular Amr Moussa, ex-chanceler de Mubarak, e o islamita (relativamente) moderado Abdel Moneim Abol Fotouh. Mas a últimas pesquisas trouxeram uma surpresa. Agora, quem diria, o último premiê de Mubarak, Ahmed Shafiq, aparece forte no páreo.

Difícil prever o futuro do Egito, mas há quem o faça, e com cores soturnas. Entre um kebab e um café turco, leio o mais recente livro do jornalista britânico John Bradley “After the Arab Spring” (depois da primavera árabe, não publicado em português). Baseado nos dez anos que viveu no Egito, Bradley não tem dúvidas: o país dos faraós segue o mesmo roteiro do Irã, caminhando em direção à teocracia islâmica.

John Bradley talvez esteja sendo pessimista demais, mas ele tem credenciais para ser ouvido. Pelo que sei, foi o único analista a prever a revolta contra Mubarak, ainda em 2008, num livro que na época foi proibido de sair no país pelo ex-ditador. Se o economista Nuriel Roubini ficou famoso como “Dr. Apocalipse”, por ter previsto a crise financeira global, Bradley faz o papel de profeta das trevas do mundo árabe pós-primavera.

Antes de pegar o meu vôo para o Cairo, traduzo aqui um trecho de seu livro, em que Bradley explica o paralelo que faz entre a Revolução Islâmica do Irã e a revolta que derrubou Mubarak.

“A Revolução Iraniana de 1979 é sempre descrita, de forma imprecisa, como uma revolução islâmica, mas em seus estágios iniciais ela tem uma espantosa semelhança com o Egito de janeiro de 2011. As massas nas ruas foram atraídas de todos os setores da sociedade iraniana; a classe trabalhadora e a classe média, marxistas, antiimperialistas, feministas, reformistas de direita de dentro do sistema _ e, sim, também islamitas. No caos do Irã pós-revolucionário, as forças do aiatolá Khomeini emergiram como a oposição mais poderosa, disciplinada e bem organizada, e ele era o líder mais reverenciado e carismático. É por isso que suas hordas islamitas foram capazes eventualmente de triunfar, massacrando os rivais que, apenas meses antes, haviam colocado nelas sua confiança como companheiros de revolução. Independentemente de seu apoio minoritário, os islamitas no Egito tendem a ocupar o vácuo da mesma forma. Em seguida, eles irão impor sua agenda sobre a maioria, embora ainda exista motivos para esperança de que não o farão com o mesmo nível de violência tirânica e a brutalidade como ocorreu no caso do Irã”.

Não tenho tantas certezas como Bradley. As eleições presidenciais da próxima semana começarão a desvendar se o novo Egito está mais para a Turquia ou para o Irã. A partir de amanhã trarei relatos diários sobre esse momento crítico da mãe de todas as revoluções árabes aqui no blog e na versão impressa da Folha.

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Oposição de papel

Por Marcelo Ninio
13/05/12 14:21

 

Netanyahu e Mofaz se cumprimentam após anunciarem a coalizão (Foto: Reuters)

Binyamin Netanyahu tem sido louvado como estrategista brilhante pelo surpreendente acordo costurado há poucos dias com o Kadima, até então o maior partido de oposição, que resultou na maior coalizão de governo já formada em Israel.

A verdade é que a supermaioria caiu no colo do premiê. A iniciativa partiu de Shaul Mofaz, líder do Kadima, apavorado com as pesquisas de opinião que previam o naufrágio de seu partido, caso as eleições fossem mesmo antecipadas para setembro. Sem chances de vitória, o general se rendeu ao inimigo para sobreviver politicamente.

Mofaz entregou de bandeja a maior bancada do Parlamento em troca de promessas vagas e sem ganhar sequer um ministério. Que premiê não aceitaria um presente desse?

Muito mais que uma suposta genialidade de “Bibi”, a coalizão escancarou a fragilidade da oposição em Israel e o deserto de idéias alternativas para chacoalhar o ceticismo do público e resolver os principais problemas do país, principalmente o conflito com os palestinos.

O assassinato de Yitzhak Rabin, em 1995, e a série de atentados terroristas palestinos, logo depois, decretaram a morte do processo de paz e empurraram Israel para a direita. A esquerda tornou-se irrelevante e, nos últimos anos, a impressão é que a única oposição digna do nome está reduzida não a um partido político, mas a um jornal, o excelente “Haaretz”.

Mas uma oposição de papel não é suficiente para equilibrar um jogo em que Netanyahu e seus aliados da direita tem vencido com facilidade. Sob a liderança da jornalista Sheli Yechimovich, o Partido Trabalhista tem agora um ano para chacoalhar a indiferença do eleitor de centro-esquerda e provar que pode voltar a ser um adversário ao Likud de Bibi, como nos tempos de Rabin.

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Rio+20, o novo embate Israel-Palestina

Por Marcelo Ninio
10/05/12 06:25

Manifestante palestino com a bandeira brasileira em protesto na Cisjordânia contra a ocupação israelense, dezembro de 2010 (Foto: France Presse)

 

A Rio+20 promete ser palco do próximo embate diplomático entre palestinos e israelenses.

O presidente da ANP (Autoridade Nacional Palestina), Mahmoud Abbas, pretende usar a conferência da ONU sobre desenvolvimento sustentável, no próximo mês, para reforçar a campanha pelo reconhecimento internacional da Palestina.

A iniciativa faz parte de uma estratégia iniciada no ano passado. A tentativa de reconhecimento da Palestina como membro pleno da ONU, em setembro, acabou sendo barrada no Conselho de Segurança. Logo em seguida, porém, a Unesco (Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura) se tornou a primeira agência da ONU (e única, até agora) a aceitar a Palestina como membro.

A participação da Palestina como um dos Estados presentes à cúpula ambiental no Brasil, um país considerado aliado da causa, daria novo fôlego à estratégia, calcula a ANP. Sem perspectiva de uma retomada das negociações de paz, paralisadas desde 2008, a liderança palestina aposta no reconhecimento internacional para pressionar Israel.

A iniciativa deu origem a uma nova queda de braço diplomática. Segundo a rádio israelense Galei Tzahal (emissora do Exército), o governo israelense tenta obter o apoio de EUA, Canadá e outros aliados para impedir o reconhecimento do Estado Palestino na Rio+20. O argumento é que o conflito deve ser resolvido na mesa de negociação, e não de forma unilateral na arena diplomática.

Ainda não está claro se o premiê israelense, Binyamin Netanyahu, participará da cúpula. Abbas, me disseram fontes palestinas, só irá com o status de chefe de Estado.

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Por trás das imagens de guerra

Por Marcelo Ninio
30/04/12 18:28

 

Ferido, o rebelde líbio Hamid Shwaili grita por ajuda em Misurata. Ele morreu pouco depois (André Liohn)

O paulista André Liohn ganhou na semana passada uma das maiores honrarias do fotojornalismo mundial, a Medalha de Ouro Robert Capa. Premiado por um conjunto de 12 fotos da guerra civil na Líbia, Liohn é o primeiro sul-americano a receber a medalha desde que ela foi criada, em 1955.

Conheci André na fronteira entre Egito e Líbia em fevereiro do ano passado, logo no início da revolução que levaria ao fim do ditador Muamar Gaddafi. Poucos dias depois, perto do porto petroleiro de Brega, avistei André entre um grupo de fotógrafos que pegou carona numa caminhonete de rebeldes líbios, a caminho da frente de batalha com as forças de Gaddafi. A viagem durou pouco: pouco depois eles voltavam a pé, forçados a recuar por foguetes que destruíram a caminhonete e custaram a vida de vários rebeldes. Mesmo com dez anos de experiência em zonas de combate, André estava visivelmente abalado. Mas a atração pelo front não diminuiu: no dia seguinte já estava dentro de uma ambulância rumo aos combates.

Aquele foi o começo de uma longa cobertura para André, que durante meses registrou de perto (e por dentro) alguns dos momentos mais dramáticos e sangrentos da guerra. Em Misurata, cidade que durante semanas ficou sitiada pelas forças gaddafistas, foi ele quem reconheceu os corpos dos fotógrafos Tim Hetherington e Chis Hodros, mortos num bombardeio.

Nascido em Botucatu, André, 39, saiu há vinte anos do Brasil. Cortou lenha alguns meses na Suíça e depois se mudou para a Noruega, onde se estabeleceu. Hoje vive com a mulher e os dois filhos no vilarejo montanhoso de Ariano Irpino, sul da Itália. No ano passado, quando cobriu todas as revoltas árabes, ele passou mais de metade fora de casa.

André é um dos poucos brasileiros que integram a confraria itinerante dos fotógrafos guerra. Profissional independente publicou em alguma das mais importantes publicações do mundo, como as americanas “Newsweek”, “Time” e “New York Times”, e as européias “Guardian” e “Spiegel”, André teve a possibilidade de ficar longos períodos nas áreas de conflito, o que certamente faz a diferença. Com a convivência, o drama anônimo ganha nome e sobrenome.

Vi isso de perto quando fomos juntos no ano passado cobrir para a Folha a tragédia da seca na Somália. Encurralados entre a fome e o terror islamita, milhares de refugiados num campo de refugiados da capital, Mogadishu, mendigavam um prato de comida onde nem a ONU se sentia segura para operar.

Mesmo já tendo feito algumas coberturas de conflito, para mim Mogadishu foi um choque. Principalmente a falta de mobilidade. Em qualquer saída, e elas eram curtas, estávamos sempre acompanhados de escolta com pelo menos três seguranças com fuzis. Sair do carro, mesmo só por alguns minutos, era uma temeridade.

André já havia estado na Somália muitas vezes, o que encurtou os caminhos esburacados de Mogadishu. Ficávamos horas trancados no quarto de um hospital, à espera da escolta. Sem ela, até ir à esquina comprar uma Coca-Cola era risco de vida. Para passar o tempo, assistimos a “Tropa de Elite 2” no computador. As milícias cariocas na tela, as islâmicas do lado de fora. Surreal. E conversas em tempo real sobre o papel dos jornalistas  em situações extremas. Trabalhar na linha de frente é tomar decisões o tempo todo. De alguma forma, muitas moldarão a opinião pública sobre o conflito.

André Liohn é o entrevistado desta segunda-feira do programa Roda Viva, da TV Cultura. Ótima chance de conhecer o outro lado das imagens de guerra.

Rebeldes líbios se preparam para atacar tropas leais a Gaddafi em Misurata (André Liohn)

 

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A arte da revolução no Egito

Por Marcelo Ninio
16/04/12 20:25

O Egito vai mal? A maioria dos 82 milhões de egípcios responderá positivamente.

Desde a revolta que derrubou o ditador Hosni Mubarak, a economia despencou, a insegurança deteriorou-se e a política mergulhou num turbilhão de incerteza. Uma junta de militares septuagenários se aboletou no poder, islamitas passaram a dominar o Parlamento e ex-caciques do antigo regime ensaiam um retorno.

Os jovens que deflagraram a mudança se perguntam: foi para isso que fizemos a revolução? Como em outras revoluções, quem destronou a velha ordem não tem força para criar a nova.

Dá para entender a frustração. Para quem nunca viu um futuro, há pressa em começa-lo quando ele aparece de surpresa. Mas há algo no ar que pouco mais de um ano atrás só existia em sonhos. Um vento de liberdade que por vezes insufla o caos, mas é um alívio quando comparado à asfixia das últimas décadas. Sobra mais oxigênio, mesmo sob as quantidades industriais de gás lacrimogêneo usado pela polícia para dispersar os protestos. Não é pouco.

Um exemplo dessa mudança de ares é a incrível explosão de arte de rua que tomou conta do Egito. Antes todo o espaço público era dominado pela ditadura, agora uma parte dele está coberto de opinião, cores e protesto. Muros se transformaram no símbolo mais evidente de que algo mudou. E ajudaram a soltar o grito de talentosos e incansáveis artistas.

Abaixo, alguns exemplos, reunidos pela página do Facebook “Revolution Graffiti – Street Art of the New Egypt”:

´Blocos de concreto usados pelo Exército para isolar uma rua no Cairo são usados para criar uma ilusão de ótica

 

"Máquina da paz", fuzil dispara pombos num muro do Cairo

 

"Mural dos olhos perdidos", no Cairo, homenagem aos manifestantes que tiveram os olhos atingidos por disparos da polícia

 
 
 
 

Um tanque contra o panda, viaduto no Cairo

Anjos numa batalha de gás lacrimogêno, Cairo, do artista Ammar Abo Bakr

Che Guevara muçulmano, Cairo, do artista Sad Panda

Cairo

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Pai do processo de paz leva sua frustração ao Brasil

Por Marcelo Ninio
11/04/12 10:47

Rabin, Clinton e Arafat na Casa Branca, após a assinatura do primeiro acordo entre israelenses e palestinos, em 1993

Um dos arquitetos da histórica reconciliação entre israelenses e palestinos chega hoje a Brasília com uma mensagem de pessimismo sobre o futuro do processo de paz.
 
O ex-ministro israelense Yossi Beilin, um dos principais negociadores dos Acordos de Oslo, em 1993, acredita que só uma ação drástica poderá chacoalhar a inércia dos últimos anos, que anuviou a perspectiva de um acordo de paz e a solução de dois Estados.
 
Em carta publicada há poucos dias pela revista “Foreign Policy”, Beilin apela ao presidente palestino, Mahmoud Abbas (também conhecido como Abu Mazen), que desmonte a ANP (Autoridade Nacional Palestina) e devolva as responsabilidades pela administração da Cisjordânia ocupada a Israel.
 
“Admito que jamais acreditei que chegaria o momento em que eu teria de dizer essas palavras”, escreveu Beilin, que já no título da carta deixa clara sua indignação com a paralisia das negociações. “Caro Abu Mazen: acabe com essa farsa”.
 
Convidado pelo deputado federal Alfredo Sirkis (PV-RJ), Beilin participará amanhã de uma sessão conjunta das comissões de Relações Exteriores da Câmara e do Senado ao lado do palestino Yasser Abed Rabbo, secretário-geral da OLP (Organização para a Libertação da Palestina). Os dois são parceiros na “Iniciativa de Genebra”, uma detalhada proposta de acordo formulada dez anos depois de Oslo, que nunca saiu do papel.
 
 Conversei com Beilin pouco antes de seu embarque para o Brasil para saber por que ele defende o desmonte da ANP, criada pelos acordos que ajudou a negociar. Para Beilin, diante do desinteresse do premiê israelense, Binyamin Netanyahu, e do fortalecimento de radicais de ambos os lados, o fim da ANP é a forma de de tirar o processo de paz do coma profundo.
 

“Penso assim há muito tempo. A nossa intenção era terminar tudo em maio de 1999”, diz Beilin. “Já deveriam ter desmontado a Autoridade Palestina há mais de dez anos. O que acontece é que os opositores de Oslo o transformaram em algo que os ajuda a não chegar a um acordo final. Querem manter o acordo interino para sempre. E não podemos apoia-los nisso.”

Como isso ajudará o processo de paz? O fim da ANP não cria o risco de uma volta à estaca zero, ao período pré-Oslo?

Não há como voltar ao período pré-Oslo. O que foi feito não mudará. Por exemplo, antes de Oslo não se sabia exatamente como seria o acordo final. Hoje isso é bem mais claro. Antes de Oslo, os palestinos que chegaram à Cisjordânia do exterior não estavam lá, incluindo Abu Mazen. Eles continuarão a liderar a OLP. O fim da ANP não deixará Israel sem um parceiro [para um acordo]. Mas não haverá mais ministros responsáveis por assuntos como água, energia e agricultura na Cisjordânia. E isso é uma mudança que obrigará Israel a pensar no que fazer. Toda a administração da Cisjordânia voltará a Israel. É uma forma de pressionar Israel, os EUA e também o Hamas [grupo islâmico palestino que controla a faixa de Gaza e se opõe a um acordo com Israel].”

Dois dias antes de viajar para o Brasil, Beilin, 63, esteve com o presidente palestino em Ramallah, onde repetiu o apelo. Segundo o ex-ministro israelense, Abu Mazen respondeu que o desmonte da ANP é uma opção que ele “leva a sério”, caso Netanyahu não atenda às condições palestinas para a retomada das negociações, principalmente o congelamento das construções de assentamentos judaicos nos territórios ocupados.

Na próxima semana, o premiê palestino, Salam Fayyad, deve encontrar-se com Netanyahu, a quem entregará uma carta de Abu Mazen com as condições. Beilin não tem nenhuma esperança de que o encontro resulte em algo.

“Não há nenhuma chance. Netanyahu não está pronto para um acordo nem disposto a suspender os assentamentos ou declarar as fronteiras de 1967 como a base de um Estado palestino”, diz ele.

Na avaliação de Beilin, o fim da ANP também colocaria pressão no Hamas, que é contra o processo de paz mas se beneficia de financiamento da ANP, em torno de US$ 200 milhões por mês.

No Congresso brasileiro, Beilin explicará suas idéias e dirá que atualmente não há condições para um acordo de paz permanente.

“Acho que no momento, certamente com o governo de Netanyahu, é impossível chegar a um acordo final. O caminho mais prático é fazer mais um acordo interino, que estabeleça fronteiras temporárias e que reconheça o Estado palestino”, defende.

Sirkis explica que o convite a Beilin e Abed Rabbo é uma tentativa de renovar o interesse do Brasil no processo de paz, que foi intenso na segunda metade do governo Lula.

“Estive com a presidenta Dilma, na quarta-feira passada e pedi-lhe que recebesse Yossi e Yasser com um posicionamento brasileiro favorável a recolocar a questão palestina como central na crise do Oriente Médio, num momento em que a adminstração Obama teve que recuar sob pressão da AIPAC [lobby pró-Israel] e de suas circunstâncias eleitorais. A presidente teve uma reação bastante favorável, mas há algumas dificuldades de agenda em função de sua viagem aos EUA”, diz Sirkis.

Beilin diz que a comunidade internacional não está fazendo nada para ajudar no fim do impasse e que o Brasil pode ter um papel importante, mesmo sem ser um ator tradicional na região.

“O Brasil não tem um papel natural no Oriente Médio, mas pode contribuir. A Noruega também não tinha um papel natural, mas em 1993 decidiu agir e teve grande influência, apesar de ser um país pequeno”, lembra.

Beilin e Abu Mazen (direita) durante encontro nesta semana

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A primeira mulher saudita na Olimpíada

Por Marcelo Ninio
04/04/12 15:17

Jogadoras do time de basquete saudita Jedah United durante treino na Jordânia (Foto: Reuters)

Pela primeira vez na história, todas as delegações nacionais deverão ter pelo menos uma mulher na disputa dos Jogos Olímpicos de Londres. Arábia Saudita, Brunei e Qatar, países muçulmanos e únicos que até hoje só mandaram homens para as Olimpíadas, sinalizaram positivamente ao pedido do Comitê Olímpico Internacional (COI).

Brunei e Qatar já permitem a participação de mulheres em torneios regionais, mas a ultraconservadora monarquia saudita proíbe até a educação física para meninas nas escolas públicas. Por isso, mas principalmente pela importância econômica e política do país, o gesto saudita, caso se concretize, é o mais significativo.

Praticante de uma das formas mais rígidas do islã, o wahabismo, a Arábia Saudita veta o contato livre entre os sexos. As mulheres, mesmo as estrangeiras, devem estar sempre cobertas em público com a abaya, espécie de roupão preto que vai da cabeça aos pés. Mulheres são proibidas de dirigir e não podem circular em público desacompanhadas do marido ou um homem da família.

O sinal verde dado pela monarquia ao COI é um gesto significativo, mas ainda longe de representar uma mudança para as esportistas do país. A discriminação impede que elas atinjam níveis competitivos, o que torna sua possível participação em torneios internacionais pouco mais que figurativa.

Em um relatório recente da organização Human Rights Watch, são listadas algumas das restrições impostas pelas autoridades sauditas às mulheres no esporte:

– Aulas de educação física nas escolas públicas são limitadas aos meninos
– Em 2009 e 2010, o governo fecharam academias de ginástica para mulheres e negaram pedidos de licença
– Nem o Comitê Olímpico Saudita nem os 153 clubes esportivos registrados no país tem sessões femininas
– A ausência de infraestruturas esportivas para mulheres impede, na prática, que elas se envolvam em práticas esportivas.

Apesar de tudo isso, o país sofre muito menos pressão do que outros, como o Irã, onde a igualdade entre homens e mulheres, embora longe do ideal, é bem maior que na segregação imposta pelos sauditas. A começar pelo direito ao voto, que as iranianas tem desde 1963, e as sauditas até hoje não.

Dois pesos e duas medidas, guiados pelos conhecidos interesses políticos e econômicos. A Arábia Saudita é o maior exportador mundial de petróleo e cada vez mais ocupa o lugar do caótico Egito, atualmente mergulhado no caos pós-Mubarak, como o país mais influente do mundo árabe. Além do petróleo, a velha rivalidade da monarquia sunita com o Irã xiita aproxima os sauditas de EUA e das potências européias.

Outras distorções chamam atenção. Embora não dê brecha à oposição doméstica e tenha mandado tropas para reprimir a revolta da maioria xiita no Bahrein, a Arábia Saudita lidera a pressão contra o regime sírio, onde defende a livre expressão que não permite em casa.

Um diplomata baseado em Riad com quem conversei recentemente relativizou o impacto da insatisfação e também da desigualdade entre os sexos. Disse que a maioria das mulheres sauditas apoia o rigor islâmico e se sente protegida pela segregação. E que o movimento que, há poucos meses, desafiou a proibição às mulheres de dirigir, representa uma pequena minoria.

Pode ser. Mas fiquei pensando como se sentirá a presidente Dilma num país em que as mulheres podem ser punidas com chicotadas por dirigir. A menos que alguma coisa mude, Dilma tem data marcada para ir ao país: 2014, na Cúpula América do Sul-Países Árabes, prevista para acontecer na capital saudita.

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Palestina: o show não pode parar?

Por Marcelo Ninio
03/04/12 21:09

Palestino joga pedra em soldados israelenses na passagem de Kalandia, entre Jerusalém e Ramallah (Foto: Reuters)

 

A cena é um ícone dos tempos modernos: um jovem palestino com o rosto coberto desafia a pedradas o poderoso Exército israelense.

Na última sexta-feira ela se repetiu. Como num script ensaiado, soldados, manifestantes e jornalistas se posicionaram para o confronto. Em segundos, estava montado o cenário de guerra. As imagens são sempre candidatas às primeiras páginas de jornais mundo afora. Pedras contra bombas de gás lacrimogêneo e balas de borracha. Depois de algumas horas, tudo volta ao “normal”, ou seja, à ocupação israelense e à impotência de líderes dos dois lados.

Quem acompanha de perto sabe que é uma guerra limitada no tempo e no espaço. Na barreira de Kalandia, principal ligação entre Israel e a Cisjordânia ocupada e tradicional ponto de atritos entre soldados e palestinos, vi manifestantes fazendo uma pausa para o café antes de continuar com o lançamento de pedras. Em Jerusalém, turistas caminhavam calmamente e tiravam fotos das cenas dantescas de policiais israelenses avançando contra os manifestantes. O desalento palestino é autêntico, o protesto, talvez sua única arma. Assim, o “show” insiste em não parar.

Desde a segunda intifada (2000-2005), não há confrontos importantes nos territórios palestinos e a clássica imagem invertida de David e Golias mantem-se apenas como ícone. O processo de paz está em coma profundo, os israelenses se conformaram com o status quo e os líderes palestinos, divididos, não encontram um caminho para concretizar sua ambição de independência.

Tenho encontrado cada vez mais palestinos descrentes na solução de dois Estados. Para eles, a fórmula que serviu de base para todas as negociações desde 1995, quando a Autoridade Nacional Palestina (ANP) foi fundada por Yasser Arafat para ser um embrião do futuro governo independente, está sendo enterrada pela consolidação da ocupação israelense.

Uma pesquisa divulgada hoje pelo Centro Palestino de Política e Pesquisa confirma isso: 57,8% dos entrevistados disseram que a opção de dois Estados não é mais viável. Para 62,3%, o plano de Israel é anexar o território ocupado e expulsar seus habitantes. Teorias conspiratórias à parte, o desânimo é resultado de quase 20 anos de negociações de paz infrutíferas, que criaram uma rotina de ocupação e atrito da qual tanto palestinos como israelenses não conseguem se desvencilhar.

O impasse é alimentado pela falta de decisão das lideranças. Em Israel, a busca de um acordo de paz despencou na lista de prioridades do premiê Binyamin “Bibi” Netanyahu. Com a popularidade em alta, sem oposição interna e amparado por uma coalizão avessa a concessões aos palestinos, Bibi sente-se à vontade para manter um discurso dúbio, que talvez garanta a sua reeleição, mas não avança a paz: de um lado se diz a favor da solução dos dois Estados, de outro, dá esperança aos colonos de que a ocupação está longe do fim.

Enquanto isso, Netanyahu perde a chance de negociar com o Fatah e a liderança mais pragmática que os palestinos já tiveram, como disse seu antecessor, Ehud Olmert. Em discurso na semana passada, Olmert, que afirma ter chegado perto de um acordo com o presidente Mahmoud Abbas em 2008, criticou a falta de iniciativa de Israel e disse estar convicto de que o líder palestino está comprometido com a paz.

Os palestinos exigem o congelamento da expansão dos assentamentos para dialogar. Israel exige negociação sem pré-condições. Nada se move. O tempo passa.

Entre os palestinos, o status quo é a desunião. Já perdeu-se a conta das vezes em que o Fatah e o Hamas, as duas principais facções palestinas, assinaram acordos de reconciliação. A tinta mal seca, e as divergências fazem tudo voltar à estaca zero. A ANP pode conquistar vitórias aqui e ali em fóruns diplomáticos, mas isso é muito simbólico e pouco prático. Como sempre ouço quando visito a Cisjordânia, de símbolos os palestinos já estão cheios. Querem resultados. E sem resolver a cisão que dividiu os palestinos entre duas entidades rivais em Gaza e Cisjordânia, será bem mais difícil convencer o mundo de que os líderes palestinos são capazes de chegar à paz com Israel e gerir um Estado. Um desafio e tanto quando de um dos lados está o fundamentalista islâmico Hamas, patrocinado pelo Irã e guiado pela idéia de ver Israel sumir do mapa.

Os confrontos da última sexta marcaram o Dia da Terra, uma das datas do calendário anual de protestos palestinos. Começou em 1976, quando seis árabes israelenses foram mortos em manifestações contra a desapropriação de terras.

Antecipando-se à versão 2012 do evento, o mais popular líder palestino mandou, da cadeia, uma mensagem convocando uma onda de protestos não violentos contra a ocupação. Condenado à prisão perpétua por liderar a segunda intifada, Marwan Barghouti, do Fatah, descartou a negociação com Israel como opção para alcançar a independência palestina.

Prenúncios de uma terceira intifada circulam há anos, sem nunca se materializar. Na pesquisa do CPPP, 51,9% dos palestinos se dizem favoráveis a uma resistência “popular, não violenta e desarmada”. Mas é difícil saber quantos se engajariam numa nova intifada, levando em conta os péssimos resultados e as lembranças da dura resposta israelense à última. 28,7% querem a resistência armada.

Ainda de acordo com a pesquisa, se houvesse uma eleição para presidente palestino com Barghouti no páreo, ele venceria com 64% dos votos. Mas não é só por isso que sua mensagem deve ser levada a sério. Um status quo cômodo só para um lado não é sustentável.

Nos próximos dias espera-se nova movimentação para retomar a negociação. O script já é conhecido.

 

 
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Obrigado, Marcelo

Por Marcelo Ninio
26/03/12 14:48

 

Meu xará comemora um gol pelo Real (Foto: Reuters)

O fraco desempenho da seleção de Mano e os escândalos na CBF podem abalar a fé dos brasileiros em seu futebol, mas em nada afetam a sua espantosa popularidade no Oriente Médio.  Um verdadeiro “soft power”, que já me abriu muitas portas até nos lugares mais inóspitos. Tenho amigos jornalistas que levam camisas da seleção em viagens como presentes estratégicos para facilitar o trânsito
 
Futebol é uma língua universal, feita de nomes de jogadores. Para mim, isso acabou tendo um efeito inesperado e bem-vindo.
 
Sempre achei meu nome fácil. Por isso também nunca entendo quando alguém tem dificuldade em captá-lo. Às vezes tenho que repetir o sobrenome várias vezes, principalmente no telefone, até perceberem que não sou uma versão em carne e osso do fenômeno meteorológico El Niño.
 
O primeiro nome também causa confusão em minhas viagens pela região. Em Israel muitas vezes viro um afrancesado “Marcel”. Nos países árabes, a versão mais comum tem a adição de um misterioso “i”, e surge o “Marcelio”. Não adianta corrigir, o “i” sempre volta.
 
Há variações. Uma jornalista egípcia com quem converso regularmente sempre me chama de Marcelino, mesmo depois de trocas frequentes de email. Já desisti de corrigi-la. Nunca perguntei, mas pode ser a lembrança do clássico filme espanhol Marcelino pan y vino, do pequeno órfão que faz milagres.
 
Mas algo mudou nos últimos anos. Árabes, principalmente homens, começaram a falar meu nome corretamente, de primeira. “Marcelo, como o do Real Madrid?”, exclamam, quase num reflexo. O milagre é obra do lateral-esquerdo Marcelo, que vi começando a carreira no Fluminense e hoje é uma estrela internacional jogando com os galácticos do Real Madrid e pela seleção brasileira.

Nos países árabes, onde a paixão pelo futebol é avassaladora, todos torcem para algum time europeu. Barcelona e Real Madrid são uma febre. A Al Jazeera Sports, braço esportivo da poderosa rede de TV do Qatar, transmite jogos de todos os campeonatos importantes do mundo, inclusive os brasileiros.

 Por isso, sou agradecido ao meu xará do Real Madrid. Graças a ele, tenho repetido meu nome muito menos. E falado bem mais de futebol.
 
Agora, Marcelo, só falta você voltar a jogar no Fluminense.
 
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Em Israel, paz e amor ao Irã

Por Marcelo Ninio
20/03/12 14:37

 

Adepta da campanha iniciada por israelenses contrários ao ataque: "Iranianos, nós amamos vocês" (Reprodução)

Finalmente uma notícia refrescante no meio da fogueira de ameaças e profecias apocalípticas que cercam as relações entre os arquiinimigos Israel e Irã.

Cansados de ouvir os dois governos batendo tambores de guerra, um casal israelense lançou uma campanha para estender a mão aos iranianos, sem intermediários. Ou melhor, por meio do intermediário universal, o Facebook.

Ronny Edry e Michal Tamir, artistas gráficos de Tel Aviv, publicaram na rede social fotos suas com os filhos e os dizeres: “Iranianos, nós nunca bombardearemos seu país. Nós amamos vocês”.

Junto com as imagens, a mensagem: “Ao povo iraniano, a todos os pais, mães, crianças, irmãos e irmãs, para que haja uma guerra entre nós, primeiro precisamos ter medo e odiar. Não tenho medo de vocês, não odeio vocês. Sequer conheço vocês. Nenhum iraniano jamais me fez mal algum”.

Não demorou muito e centenas de israelenses aderiram à campanha, formando uma galeria de fotos de pessoas que endossam a mensagem de paz ao país persa.

Ronny contou ao jornal “Haaretz” que também recebeu recebeu respostas de israelenses irados, chamando-o  de entreguista,  ingênuo e palavras impublicáveis. Mas o que mais o impressionou foi a reação de iranianos, agradecidos.  De Teerã chegaram mensagens parecidas, com fotos de iranianos manifestando afeto aos israelenses e repudiando a escalada retórica dos dois governos.

 

Resposta de uma iraniana à campanha: "Israelenses, nós somos seus amigos"

 
Das páginas do Facebook, a mensagem agora vai ganhar as ruas de Israel. Inspirada pela campanha, uma passeata de repúdio à guerra foi marcada para o próximo sábado em Tel Aviv. Mantendo o espírito de criatividade gráfica que originou a campanha, foi criado um poster bem-humorado para a ocasião (abaixo), xingando o presidente iraniano, Mahmoud Ahmadinejad, e o premiê israelense, Binyamin Netanyahu. Na imagem, os dois viram uma única criatura, Mr. Ahmedinyahu, que precisa ser contida.
 
 No início do mês, uma pesquisa de opinião mostrou que quase 60% dos israelenses são contra um ataque ao Irã. Isso não se refletirá na passeata, que deve ser pequena. No Irã, onde os protestos de rua contra o regime teocrático desapareceram sob dura repressão, a campanha ficará mesmo só na internet. 
 
 

Mensagem a "Mr. Ahmedinyahu": "Não queremos guerra"

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