Um goleiro na linha de frente da revolta síria
02/03/12 13:17ANTAKYA, TURQUIA – Tiros os sapatos e entro numa das tendas do campo de refugiados sírios de Boynuyogun, na fronteira com a Turquia. Quatro homens reunidos em torno de um aquecedor portátil assistem petrificados à TV Al Jazeera. Na tela, notícias sobre a repressão do regime contra a oposição em Homs, cidade que se tornou o maior foco da revolta contra o ditador Bashar Assad.
Em meio às cenas de tanques avançando rumo ao centro da cidade sitiada, uma imagem se destaca: num palco improvisado, um jovem grita palavras de ordem contra Assad, para delírio dos manifestantes. Numa revolução sem líderes aparentes, o destaque me chama a atenção. Pergunto quem é o jovem. Orgulhosos, os quatro respondem quase ao mesmo tempo: é Abdul Basit Sarut , goleiro da seleção síria sub-23.
Sarut virou ídolo entre os opositores assumindo uma posição antagônica à que tinha nos campos. Nos protestos, ocupa a linha de frente. A liderança lhe custou um preço alto. Seu irmão foi morto e ele próprio ficou ferido em uma das três tentativas de assassinato feitas pelas forças de Assad. Em agosto do ano passado, Sarut já havia incomodado o regime ao sair em defesa do goleiro da seleção principal, Mosab Balhous, preso após ser acusado de abrigar “gangues armadas”.
Em entrevista divulgada na internet logo após ser ferido, Sarut, de 20 anos, lamenta a passividade do mundo diante da crise na Síria e pede uma intervenção militar. O mesmo, aliás, que tenho ouvido de todos os refugiados.Nos contatos com os refugiados, o mundo da bola é um assunto quase inevitável. Os sírios adoram futebol e não é todo dia que aparece um brasileiro para conversar. Já adorado pela habilidade em campo, o argentino Messi conquistou de vez os opositores desde que anunciou uma doação para os feridos em Homs. “E o Ronaldo, não vai nos ajudar?”, me perguntam.
Futebol e protesto político tem uma ligação antiga nesta região dominada há décadas por ditaduras. Como mostrou a recente tragédia no estádio de Port Said, no Egito, onde 74 torcedores morreram numa briga de torcidas que acabou reacendendo os protestos contra a junta militar.
Em seu excelente blog “O turbulento mundo do futebol no Oriente Médio”, James Dorsey explica a ligação:
“Os estádios são um símbolo da batalha por liberdade política; oportunidade econômica; identidade étnica, religiosa e nacional; e direitos de gênero. Ao lado da mesquita, o estádio era, até a erupção da revolta árabe, no fim de 2010, o único espaço público alternativo para manifestação de ressentimento e frustração”.
Depois que as ruas se abriram para o protesto, o jovem goleiro sírio tirou as luvas e se juntou à torcida.
Enquanto no Brasil os incultos e frívolos craques da bola se importam apenas com seus contratos e sua rotina de baladas, uma jovem promessa do futebol sírio arrisca sua carreira e sua própria vida e se junta aos milhares de anônimos que lutam pela democracia em seu país.
goleiro corajoso e heroi porque a demora para a intervencao internacional?
Sensacional Marcelo, que personagem!!
Pena que no Brasil nossos jogadores sejam acéfalos incapazes mesmo de criticar a roubalheira desmedida do Ricardo Teixeira e seus pares..